Miley Cyrus vai de Pink Floyd a Lady Gaga, mas pesa na ambição e lança outro álbum quase bom
28/05/2025
(Foto: Reprodução) 'Something beautiful' sai na sexta (30), com produção preocupada demais em impressionar. Disco se sai melhor em momentos despretensiosos; veja análise do g1 em VÍDEO. Miley Cyrus lança "Something beautiful", mais um álbum quase bom
Título: "Something beautiful"
Artista: Miley Cyrus
Nota: 7/10
Depois de emplacar o hit global "Flowers" e de ganhar seu primeiro Grammy, Miley Cyrus lançará nesta sexta-feira (30) "Something beautiful", o álbum que poderia finalmente cravar seu nome no primeiro escalão do pop. Mas, como já aconteceu outras vezes em sua carreira, o resultado ficou... quase bom.
Entre os nove discos da artista americana, a maioria não chega a tanto, mas "Endless Summer Vacation", de 2023, e sobretudo "Bangerz", de 2013, se destacam por sinalizarem momentos de virada criativa na carreira de Miley.
Miley Cyrus em foto de divulgação do álbum 'Something beautiful'
Divulgação
O trabalho de 2013 foi divulgado em meio ao alvoroço causado pela performance da cantora no MTV Video Music Awards (VMA) daquele ano, um marco da cultura pop. Entre quem acompanha esse universo, todo mundo se lembra (ou ao menos ouviu falar) de Miley com a língua para fora sensualizando com ursos de pelúcia e um dedo gigante de espuma.
A apresentação marcou a morte da artista como a estrela da Disney protagonista de "Hannah Montana". A série sobre uma adolescente normal com seu alter ego popstar foi a responsável por alçar a filha do cantor country Billy Ray Cyrus ao estrelato.
Miley tinha 20 anos quando saiu "Bangerz", um álbum de refrãos cativantes para cantar no chuveiro ("Wrecking ball" está no top 5 melhores músicas para fazer o shampoo de microfone), mas carregado da rebeldia ingênua, que tem tudo a ver com essa fase da vida.
Robin Thicke e Miley Cyrus se apresentam no VMA 2013
Rick Diamond/Getty Images for MTV/AFP
Dez anos depois, ela perdeu a ingenuidade no "Endless summer vacation", mas as letras debochadas sobre seu processo de libertação pessoal não foram suficientes para dar identidade ao disco de um hit só.
Já em "Something beautiful" não falta personalidade: é uma ópera pop pós-apocalíptica, cheia de glamour, alta costura e visuais incríveis -- até porque o disco chega acompanhado de um filme para os cinemas. A cantora, agora com 32 anos, se mostra decidida a criar o grande álbum da carreira.
O problema é justamente a ambição exagerada. Na ânsia de um som sofisticado, Miley mistura referências -- que vão de Pink Floyd a Lady Gaga, passando por disco e funk dos anos 70 -- e cria um repertório inconsistente. Algumas músicas têm tantos elementos que não dá para prestar atenção em nenhum.
Uma boa síntese é "Walk of fame", música que deve gerar a maior repercussão entre as ainda desconhecidas pelo público -- Miley já divulgou três, além de um prelúdio. São seis minutos de uma batida eletrônica sombria, com muito potencial e menções a "Ray of light", de Madonna, e "Born this way", de Gaga. No entanto, a produção está tão preocupada em impressionar que acaba ofuscando o ótimo dueto de Miley e Brittany Howard, vocalista da banda de blues rock Alabama Shakes.
Na linha tênue entre a influência e a imitação, "Reborn", outra da parte mais dançante do disco, tem canto gregoriano, elementos industriais e letra sobre um amor que "cura". Mais Lady Gaga que isso, impossível. Só que o maximalismo da Mother Monster não brilha tanto aqui.
Miley tem falado em entrevistas que se inspirou em "The wall", disco clássico do Pink Floyd, para criar o conceito de "Something beautiful". Na sonoridade, a influência ajuda a construir a vibe dramática de faixas como "Pretend you're God" e "Give me love". Já liricamente, clichês de amor do tipo "I will give all you want all night long" ("eu darei o que você quiser a noite toda") afastam o trabalho da cantora da profundidade temática da banda de rock progressivo.
Na música-título, guitarras distorcidas explodem no refrão de um R&B suave e sensual, uma virada surpreendente, que não chega a ser a de "Happier than ever", de Billie Eilish, mas também funciona bem na letra.
É empolgante a dobradinha com "End of the world", um pop-rock hedonista, que faz lembrar "Spitting off the edge of the world", do Yeah Yeah Yeahs. Miley diz: o mundo vai acabar mesmo, vamos gastar todo o nosso dinheiro. Quando ela esquece de buscar profundidade, o "Something beautiful" se sai melhor, faz lembrar até a espontaneidade do "Bangerz".
Miley Cyrus apresentou 'Flowers' durante a cerimônia do Grammy 2024
Mike Blake/Reuters
No fim das contas, esse pode não ser o grande álbum da carreira da cantora, mas é mais uma de suas eras para acompanhar com carinho, como se acompanha a vida de uma prima querida. A pretensão do disco nada tem a ver com uma postura arrogante de diva inacessível, que ela nunca fez questão de adotar.
Pelo contrário: quando vestiu as perucas de Hannah Montana, quando despirocou no VMA e quando vibrou ao ganhar o Grammy, Miley sempre se mostrou humana, e se abriu com fãs conversando de igual para igual. É por isso que nunca faltará torcida: seu grande álbum ainda virá.
Cartela resenha crítica g1
g1